newsletter #16

Antes de começar a newsletter, um anúncio importante! Não sei se vocês já repararam, mas temos um disco novo no forno, quase pronto para sair! Ele se chama VISITA, e está uma graça. Sei que sou suspeito para falar, então vejam vocês mesmos a capa neste link de pré-save. Ou na contagem regressiva do Spotify. Que tal? Gostaram do bichinho? Querem tê-lo nas mãos? Então atenção à informação em primeiríssima mão para os assinantes da newsletter: a pré-venda do vinil na FNAC já está aberta!

E tem mais! As amizades do Porto e de Lisboa vão poder assistir à estreia do VISITA ao vivo nos dias 3 e 7 de novembro! Vou ficar muito feliz de ver cada um de vocês por lá. 🩶

Agora sim, voltemos à nossa boa e velha newsletter.

A CANÇÃO É UM KARMA

Mês passado participei de uma conversa com o Nuno Artur Silva, a Gisela Casimiro e a Calí Boreaz, no MAP, em Oeiras. A conversa era para ser sobre poesia, mas resvalou em muitos outros assuntos. Às tantas, o Nuno me perguntou por que eu escrevo canções de intervenção. “Ah, Nuno! Essa é fácil!” — pensei eu. Mas quando comecei a responder, me faltaram palavras. A pergunta não era “por que escrever canções de intervenção”, era “por que eu as escrevo”. Isto é, diante de um universo de possibilidades artísticas potencialmente inesgotável, por que raios acabei escrevendo um Gentrificasamba, ou gravando um Samba de Guerrilha, ou lançando um Peça Desculpas, Senhor Presidente? Ali, no calor da conversa, acho que me saí dizendo que são gestos espontâneos, algo do tipo “eu estou no mundo, o que se passa no mundo me diz respeito” e pronto. As canções me ocorrem. Chegam até mim.

Depois o assunto mudou, a conversa terminou, eu voltei para casa, mas aquela pergunta continuou ressoando. Sabem quando a gente rebobina a fita das memórias na cabeça, e fica pensando como poderia ter respondido melhor tal coisa, em tal situação? Eu acho que tinha ficado faltando uma parte da resposta ali. A parte mais simples, na verdade. Por que eu escrevo essas canções? Porque eu não saberia fazer bem outra coisa. Quer dizer, temos aí o mundo todo estropiado, cheio de problemas. Não conseguindo resolvê-los, faço música sobre eles. “Mas isso já não é intervir?”, alguém pode perguntar. Bom, eu por aqui tenho me equilibrado algures entre a ingenuidade de achar que sim, e o cinismo de achar que não. É uma inquietação constante.

Falando em inquietação, lembro sempre do José Mário Branco, que era abertamente contra o termo “canção de intervenção”. É estranho. Logo ele, que cantava que a cantiga é uma arma. Mas é que para ele toda canção era de intervenção. Se está no mundo, e as pessoas ouvem, de um jeito ou de outro, intervém. E ele está coberto de razão. Só que depois me lembro de uma resposta que a Márcia deu ao Bernardo Mendonça no podcast “A beleza das pequenas coisas” (que recomendo a todos). Perguntou o Bernardo, assim à queima-roupa, como é o jeito dele: “Márcia, a cantiga é uma arma?”. E ela responde, na lata: “Não gosto de armas”. Eita! Nunca me esqueci dessa resposta. Ela me assombra até hoje. Parecendo despolitizante, talvez seja a resposta mais politizada possível. Lembro bem de quando ouvi esse episódio. Era 2022, estávamos em altura de eleições no Brasil, e só me ocorria aquele gesto da arminha com as mãos, gesto-símbolo da campanha de Bolsonaro. Até então eu jamais hesitaria em dizer que sim, a cantiga é uma arma. Mas como, se eu, assim como a Márcia, também não gosto de armas? Será possível combater sem armas? Haverá armas boas e armas más? Cada pergunta um labirinto, cada resposta uma armadilha.

E eu andava refletindo, observando, caminhando por esse labirinto há um tempo, sem pressa nenhuma para encontrar a saída. Até que de repente me chegou um convite. A Fundação Calouste Gulbenkian queria promover uma série de oficinas sobre canções de intervenção, voltadas para jovens de 16 a 25 anos. Pediu a um grupo consultivo de jovens dessa idade que sugerisse nomes de autores para ministrar as oficinas, e o meu foi um dos primeiros a surgir. Fiquei tão contente com isso que não consegui não topar. Mas sabem que nome eles deram à iniciativa? “A cantiga é uma arma“. Pronto. Agora te vira, Luca. É uma arma ou não é uma arma, a cantiga? Até dia 20 deste mês, quando acontece a primeira oficina, preciso dizer alguma coisa se me fizerem a pergunta. E acho bem provável que façam.

Daí passei o último mês ouvindo tudo que consegui me lembrar de música de intervenção recente, para tomar pulso do que os cancionistas de agora andam falando. Do que reclamam? O que reivindicam? Por quem falam? Para quem? Que palavras usam e não usam? Vou ouvindo e aprendendo… Cheguei a alguma conclusão? Ainda não. Acho até que estou agora mais confuso do que estava antes. Mas talvez seja mesmo esse o caminho das melhores canções de intervenção. Não o de oferecer as respostas certas, mas sim o de fazer as perguntas certas. Não sei se no momento em que vocês estiverem lendo esta newsletter ainda haverá vagas, mas vejam. As informações estão aqui. Com sorte ainda nos cruzamos no labirinto.

ANTES QUE EU ME ESQUEÇA

Lá vai o serviço completo de outubro, e ele está variadíssimo. Além da oficina, tem concerto com a Ana Deus, tem festival literário, e tem até minha primeira viagem para o País Basco!

Setúbal – dia 6, com Ana Deus: Casa da Cultura – 21h30 (entrada livre)
Óbidos – dia 19, conversa com Isabel Lucas e Sofia Perpétua: Folio Festival Literário – 19h30
Lisboa – dias 20 e 27, oficina “A cantiga é uma arma”: Fundação Calouste Gulbenkian
Bilbao – dia 29: BIME – Feira Internacional de Música

E em novembro, já sabem:

Porto – dia 3, lançamento VISITA: Novo Ático

Lisboa – dia 7, lançamento VISITA: Auditório da Reitoria da UNL

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